As meninas dos nossos olhos: Clementine

Os últimos jogos dessa geração tem sido realmente incríveis. Além dos cenários incrivelmente bonitos, temos nos deparado com histórias cada vez mais elaboradas e complexas que às vezes até sobrepujam a própria jogabilidade e nos levam a questionar sobre o que me importo mais em um jogo.

Entretanto, independente da qualidade de um ou outro aspecto, um ponto que tem chamado atenção nos últimos lançamentos são os personagens… Ou devo dizer AS personagens?

Atualmente temos dois grandes expoentes masculinos como símbolo de atores nos jogos, Nolan North e Troy Baker. Somados, eles aparecem em nada menos do que 9 blockbusters nos últimos meses em consoles, o que só confirma a qualidade dos caras e a importância que jogos tem tido para esses atores. Acho que Troy Baker, inclusive, já pode ser considerado o Andy Serkis dos videogames.

Maaaasss, nos últimos grandes lançamentos não são os personagens masculinos que despertaram a atenção dos jogadores e críticos da indústria mas sim as personagens garotas-meninas-mulheres. O mais interessante é que de todas elas, as que mais chamaram a atenção não foram as protagonistas (como Lara Croft ou Nilin) mas sim as coadjuvantes.

É unanimidade que Clementine, Elizabeth e Ellie são as melhores personagens dessa geração (ou seria da história dos games?), cada uma com uma personalidade única. (Estranho é que todas apareceram em um espaço de tempo bem curto o que confirma a hipótese de que existe uma hive mind no mundo dos videogames, mas divago). Não quero dizer, entretanto, que os personagens masculinos são ruins… Ao contrário, Lee, Booker e Joel são também muito bem construídos mas a construção das personagens femininas acaba ofuscando a participação deles.

Como disse anteriormente, conhecemos bem os dubladores e atores dos personagens masculinos. Com certeza se eu perguntar agora quem dublou Drake em Uncharted ou Booker em Bioshock Infinite você vai falar no ato mas é bem provável que você não conheça as vozes e atuações por trás das personagens femininas que citei.

Por isso resolvi descrever (sério, você já sabia que eu faria isso né) cada uma das últimas personagens que nos encantaram nos últimos jogos. Pelo post original ter ficado muito extenso, resolvi quebrá-lo em uma série que será postada diariamente.

Antes, um aviso: Provavelmente vai haver alguns spoilers dos jogos (The Walking Dead Bioshock Infinite e The Last of Us). Vou tentar minimizar ao máximo mas, se você ainda não jogou algum deles, prossiga por sua conta e risco.

Clementine – The Walking Dead

clementine

Uma criança está sozinha em casa com sua babá enquanto os pais estão viajando quando um outbreak zumbi estoura. É um plot ousado que só seria possível numa história de Robert Kirkman, o segundo autor que mais mata personagens em suas histórias.

Depois da treta inicial no jogo The Walking Dead você, na pele de Lee, chega numa casa e encontra Clemetine refugiada em sua casa da árvore. A menina está assustada e fugiu pra lá porque os monstros não conseguem subir nela. Ela só que encontrar e se reunir aos pais que viajaram.

O arco do personagem não é inédito mas é bem interessante: uma garotinha de 8 anos, inocente e amedrontada, que é jogada num mundo onde tudo deu errado e as pessoas agora querem comer você (no sentido gastronômico). Ao longo dos 5 episódios que compõem o jogo, Clementine passa de uma simples garotinha comum assustada para uma sobrevivente forte.

Também pudera, já que passou por uma situação traumática na fazenda, viu a cabeça de um companheiro sendo esmagada por um bloco de sal, quase comeu (ou comeu se você foi um jogador relapso!!! Que tipo de pai você é ein???) carne humana, foi forçada a atirar em zumbis, ver seus pais mortos e matar (ou deixar para morrer) a última figura paterna pra ela.

Entretanto, a personagem não deixou seu lado criança de lado. Momentos como Lee confrontando Clementine sobre ela ter lambido um bloco de sal é de uma sutiliza ímpar numa cena tensa.

Segundo os produtores do jogo, Clementine foi a idéia que motivou a criação do jogo como um todo… A cena final inclusive foi pensada antes de qualquer parte da história ter sido escrita.

Melissa Hutchison, a dubladora de Clementine

Melissa Hutchison, a dubladora de Clementine

Um aspecto interessante é que, segundo o diretor David Sakai, os designers do jogo queriam que a personagem fosse uma espécie de termômetro moral do jogador e que ela fosse esperta, honesta e tivesse por volta de 8 anos. O objetivo foi alcançado brilhantemente pela equipe de escritores entre eles Gary Whitta que participou de coisas como Duke Nukem Forever e de jogos como Gears of War e Prey.

Mas tudo isso só foi possível por causa da incrível dublagem da personagem. O processo para encontrar a voz perfeita para Clementine foi árdua e levou a equipe a questionar se todo o tempo gasto com o desenvolvimento da personagem seria jogado fora porque não encontravam a voz perfeita.

Foi quando surgiu Melissa Hutchison, americana que já havia trabalhado em outros jogos da Telltale Games, que fez o teste e despontou como a voz que o estúdio estava procurando. Procurei vídeos dos testes da atriz ou mesmo de alguma entrevista em que ela cita a personagem mas pelo visto ela é mais conhecida pelo trabalho de dublagem de um personagem de League of Legends… lol. Estranho dado que a atriz ganhou o prêmio de melhor atriz de 2012 Spike TV Video Game Awards devido à Clementine.

Construindo a conexão com o jogador

OK, criamos o background da personagem, definimos como será sua personalidade, motivações, encontramos a voz perfeita, tudo ótimo neh? Não. Por mais bem construído que seja um personagem ele não funcionará se não houver empatia com o expectador (ou jogador). A equipe da Telltale precisava criar uma forma de conectar o jogador àquela garotinha de forma que tivéssemos uma conexão emocional com ela. Precisávamos nos sentir responsáveis por ela. Como fazer isso?

O primeiro desafio era: o que Clementine tem de especial que nos mantenha engajados numa história tão trágica? Para Sakai, talvez apenas o desejo de acreditar que o bem prevalece. “Clementine representa a inocência e a pureza. Ela encarna o desejo do personagem principal de proteger e preservar o que há de bom na huminadade.”, disse em entrevista ao site Gameinformer.

Talvez seja uma boa motivação mas vamos além. Você tem filhos? Pense neles vivendo em um mundo onde brincar é algo raro, um mundo onde morte e perda de pessoas queridas são acontecimentos constantes e ele é obrigado a amadurecer rapidamente para não correr o risco de morrer. Pois é, ficou angustiado? Eu também.

Acredito que em dois pontos específicos do jogo essa empatia é firmada: O primeiro, já citado, é quando no Episódio 2, na fazenda de Andy, você deve descer correndo as escadas para impedir que Clem coma carne humana. Em outra cena, durante o Episódio 4, Lee e os outros invadem a cidade em busca de medicamentos e acabam numa antiga escola. Lá, Clementine lamenta por talvez nunca poder voltar à sala de aula.

clementine_haircut

Outro momento simples porém marcante na história é a decisão de Lee em cortar o cabelo de Clementine. Em situações anteriores, um zumbi a havia segurado pelo cabelo e ele não queria que isso acontecesse novamente. A cena toda é comovente e diz muito sobre o momento que ambos os personagens estão passando: http://youtu.be/dznF-4oacH8?t=6m40s

Clementine foi tida por muitos sites como uma revolução na arte de criar personagens, o que concordo. Ela tem frases marcantes, um personalidade única e carisma de sobra, o que garantiu que todos nos apegássemos a ela como se fosse nossa filha. Essa humanização da personagem garantiu que Clem criasse uma grande empatia com os jogadores e se tornasse uma das figuras mais icônicas (e fofinhas) dos videogames até o momento.

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